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sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Rio de Janeiro sediará primeira feira de jornalismo digital

O Rio de Janeiro será palco do primeiro evento direcionado às novas tenologias usadas para fazer jornalismo nas mais variadas plataformas digitais. A Digital News Show (DNS) será realizada em dezembro para um público de estudantes, profissionais, atuantes da área de jornalismo digital e interessados na área de tecnologia de modo geral.
 
A abertura do evento será feita por Maurício Menezes, jornalista, humorista e criador do show Plantão de Notícias. A DNS acontecerá nos dias 10 e 11 de dezembro no Centro de Convenções SulAmérica, no centro do Rio.
 
 
Stands de grandes grupos jornalísticos e de empresas que desenvolvem soluções de interesse da indústria do jornalismo digital estarão no evento para mostrar o que há de mais inovador nesse meio. Realidade aumentada, aplicativos móveis, infográficos interativos, QR codes, edições digitais e sistemas de publicação são alguns dos atrativos que serão expostos na feira.
 
"A Digital News Show é fruto de um ano de pesquisa de mercado. O formato de feira, além de ser algo que fará bem ao cenário e à indústria do jornalismo digital, será um parque interativo para o público e, inclusive, irá possibilitar rodadas de negócios entre os veículos e os fornecedores de soluções tecnológicas", afirma Mario Lima Cavalcanti, diretor executivo do portal Jornalistas da Web e organizador da Digital News Show.
 
O visitante poderá interagir com as tecnologias mostradas pelos expositores e, nos dois dias do evento, poderá adquirir equipamentos como tablets, smartphones, e-readers e câmeras digitais por preços atraentes. O público conhecerá também a história do desenvolvimento da internet em todo o mundo, com toda sua evolução e os acontecimentos mais marcantes.
 
Durante os dois dias de feira, serão realizados painéis de debates com temáticas ligadas direta ou indiretamente com o jornalismo digital. Um dos painéis confirmados é  “A força dos Podcasts”, com Eduardo Spohr - autor do best-seller “A Batalha do Apocalipse” e participante do Nerdcast, o podcast do site Jovem Nerd - e  Gustavo Guanabara - editor do podcast de tecnologia Guanacast. O painel terá mediação de Nick Ellis, editor-chefe do site de tecnologia TechTudo, da Globo.com.
 
Confira os outros painéis:
 
Infográficos interativos e jornalismo de dados;
Jornalismo investigativo na era digital;
Conteúdo jornalístico nos smartphones e tablets;
O uso de mapas virtuais no jornalismo;
Sistemas de publicação;
Newsgame: os games como complemento da informação;
Redes sociais como suporte do jornalismo.
 
A Digital News Show é uma realização do portal Jornalistas da Web e tem o apoio da ABRADi (Associação Brasileira das Agências Digitais), da ABRAJI (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), da Arteccom e da Revista Wide, da Faculdade CCAA e da Rede JorTec. O evento acontecerá nos dias 10 e 11 de dezembro, no Centro de Convenções SulAmérica, no Centro do Rio de Janeiro. Os stands já podem ser reservados pelos expositores e os ingressos começarão a ser vendidos em breve.
 
Fonte: Adnews

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A crise no Rio e o pastiche midiático

redação IHU

"O tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente", afirma Luiz Eduardo Soares, Mestre em Antropologia, doutor em ciência política com pós-doutorado em filosofia política, professor da UERJ e coordenador do curso à distância de gestão e políticas em segurança pública, na Universidade Estácio de Sá, em artigo publicado no seu blog, 25-11-2010.

Segundo ele, "discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?"

Eis o artigo.

Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo não se inviabilize. Faço-o por ética –supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso, me esforço por atender aos que me procuram, porque sei que atuam sob pressão, exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises, por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso, quando ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa Civil, trabalhamos tanto –ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas.

Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar com a mídia:

(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos repórteres, produtores ou entrevistadores que me procuraram.

(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes, reproduzindo o senso comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores? Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente triunfalista do discurso oficial?

(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas recorrentes são:

(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência?

(b) O que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas?

(c) Por que o governo não chama o Exército?

(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?

(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas aspas – nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas. Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí predominantes. Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua contínua reprodução.

Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso, aproveitando-me do expediente discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir. Eis as respostas, na sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:

(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança?

Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises?

Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude representa, exatamente, a postura que tem impedido avanços consistentes na segurança pública. Se a sociedade, a mídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando, enquanto Nação, a tratar do problema na perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas, para as quais não há soluções mágicas.

A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.

A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.

(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas?

Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.

Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias.

Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.

Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.

(c) O Exército deveria participar?

Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda podre das polícias.

E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos. Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas, controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.

(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?

Claro. Mais uma vez.

(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o “espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.

Palavras Finais

Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado. O canto de cisne do tráfico era esperado. Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco, com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria estadual de assistência social -- um dos melhores gestores do país --, elas não terão futuro se as polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública terão de incluir duas qualidades indispensáveis: escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.

O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios – as bandas podres das polícias -- prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.

Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?

As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições: oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.

E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada informal e ilegal.
Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.

O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.

Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Mídia teve medo de falar em intervenção

Por Alberto Dines

O Estado brasileiro venceu na quinta-feira (25/11) uma importante batalha contra o narcoterrorismo, no Rio. Foi crucial – tanto sob o ponto de vista psicológico como tático – a participação dos dez veículos blindados da Marinha e os cerca de 50 fuzileiros navais que os tripulavam. A mídia ressaltou com entusiasmo a "ajuda" das forças armadas, mas fugiu ao seu dever de explicá-la devidamente: tratou-se de uma intervenção federal.

Intervenção "branca", disfarçada, informal, pontual, mas de qualquer forma uma intervenção do Estado nacional numa unidade da federação. Mais uma vez, a mídia foi "boazinha", atendeu às conveniências e ajudou a encobrir uma realidade: o narcotráfico transcendeu à condição de crime organizado, deixou de ser um grupo empresarial diversificado. É terrorismo: disputa territórios, quer dividir o país e impor a sua lei. Uma clara e insofismável ameaça à segurança nacional.

Governantes têm horror à palavra intervenção, fogem dela como o diabo da cruz. Compreensível, a intervenção é um recurso emergencial nas repúblicas federativas. As autoridades estaduais não querem parecer frágeis, incapazes de oferecer proteção à sociedade e as federais não querem parecer autoritárias nem assumir os riscos de um eventual fiasco. Sobretudo depois de uma campanha eleitoral na qual se discutiu abertamente a federalização da segurança pública.

A mídia arriscou-se, ofereceu uma cobertura intensa da operação policial que desalojou os bandidos da Vila Cruzeiro e obrigou os facínoras a fugir acovardados, embora esta cobertura tenha desagradado ao comando das operações. A mídia tem o dever de mostrar que o Estado tem meios de proteger a sociedade.

Mas a mídia, tanto a "antiga" (segundo a classificação do comunicólogo Lula) como a blogosfera, têm a obrigação de dar o nome aos bois: narcotráfico é terrorismo, não adianta tergiversar, amaciar. A sociedade cordial não é necessariamente ingênua. Nem estúpida.

Lembrança apagada

A imprensa paulistana, embora poderosa, rica e sofisticada, mostra-se cada vez mais provinciana e medíocre. Durante os cinco dias de combates nas ruas do Rio, nenhum dos jornalões locais sentiu-se obrigado a lembrar aos seus fiéis leitores que de 12 a 19 de maio de 2006 a cidade de São Paulo, a maior cidade da América Latina, foi paralisada por uma sucessão de ataques organizados pelo PCC (Primeiro Comando da Capital).

A cidade parou com as 300 incursões e o assassinato de 55 pessoas (entre policiais e civis). O bombardeio da Paulicéia só foi interrompido depois que o então governador em exercício, Cláudio Lembo, aceitou negociar com os cabeças do PCC que atuavam a partir de um presídio de segurança máxima.

O único veículo jornalístico que lembrou o dramático episódio e o seu vergonhoso desfecho foi o Bom Dia, Brasil da Rede Globo, apresentado na manhã de quinta-feira (25).

Com bairrismo não se enfrenta o terrorismo.

Fonte: Observatório da Imprensa

Twitteiro vira central de informações sobre caos no Rio

Por Rodrigo Martins

No meio do caos no Rio de Janeiro, com a atual onda de ataques, um estudante de jornalismo do 2º ano encontrou no Twitter um meio de ajudar a população. Pablo Tavares, de apenas 23 anos e que mora em Niterói, começou a ver o número de testemunhos de pessoas que presenciaram ataques multiplicarem-se na rede de microblogging. Também viu um número impressionante de boatos. E decidiu que sua forma de ajudar seria esclarecê-las.

Foi então que na terça-feira à noite ele criou o Twitter @caosrj, o qual se tornou uma central de informações. Primeiro, começou a postar informações sobre carros incendiados e formas de escapar dos pontos de tiroteio. Quando os ataques foram ganhando volume, Pablo começou a minitorar rádios, jornais e TVs e retuitá-los.

E está conseguindo repercussão. A conta ainda tem cerca de 500 seguidores, mas, só nesta quinta-feira, ele já conseguiu mais de 300 menções, entre retweets e conversas. Acha pouco? Luciano Huck, número um em seguidores no Brasil, com impressionantes 2,5 milhões de pessoas que o acompanham, teve “só” 500 menções. Um dos twitteiros mais relevantes no Brasil, Marcelo Tas, citou o @caosrj como destaque em palestra nesta quinta-feira.

Prova da relevância é olhar o que as pessoas dizem sobre @caosrj no Twitter. @pathamilton3 elogia: “Boa iniciativa! Precisamos de conteúdos jornalísticos pautados na verdade dos fatos. Boatos geram mais caos”. A @sueliarantes pergunta: “Alguém confirma se o Shopping Carioca fechou?”. E @ranassamir recomenda aos amigos: “Siga o @caosrj e acompanhe as notícias do front”. Como essas mensções, chegam outras e outras e outras à conta.

E dá para confiar nas informações? O IDGNow conversou com Pablo nesta quinta-feira: “Eu acompanhava as notícias na mídia, principalmente sobre Niterói, onde moro. Mas vi que os veículos estavam atrasados em relação ao Twitter, o que é natural. Afinal, há muitos boatos, os veículos precisam checar antes. Mas comecei a ver que muitas pessoas relatavam casos que elas estavam vendo, como carros sendo queimados ou locais de tiroteios. Quando via que três, quatro ou mais usuários confirmavam uma história, a probabilidade de ela ser verdadeira é grande. E o mesmo acontecia para desmentir: quando algo não está certo, os outros usuários desmentem”, diz.

Quando uma informação não é confirmada depois, Pablo diz que manda um tweet em seguida desmentindo-a.

Fonte: Estadão