Por Andres Kalikoske e Éderson Pinheiro da Silva
Consagrada como um dos maiores sucessos da TV brasileira na década de 2000, O Clone está de volta dez anos após sua primeira exibição. Com roteiro de Glória Perez, direção de Jayme Monjardim e elenco consagrado, esta superprodução da Globo carrega consigo a difícil missão de elevar os índices de audiência do Vale a Pena Ver de Novo, carro-chefe da programação vespertina. Sua antecessora, Sete Pecados, apesar de uma exibição inédita vitoriosa, derrubou a audiência da tradicional sessão de reprises. No ar desde o último dia 10/01, O Clone não demorou em mostrar sua potencialidade: na Grande São Paulo registrou média de 18 pontos com pico de 21. Há uma forte tendência destes números se potencializarem com o desenrolar da história, já que, com o falecimento do personagem Diogo (Murilo Benício), o cientista Albieri (Juca de Oliveira) resolverá criar um clone a partir de amostras genéticas de seu irmão, Lucas (também interpretado por Benício).
Ainda é cedo para afirmar se O Clone repetirá, até seus últimos capítulos, o sucesso de outras novelas exibidas no Vale a Pena Ver de Novo, como Senhora do Destino, em 2010, A Viagem, em 2006, História de Amor, em 2002 ou Mulheres de Areia, em 1997. Estes títulos, em sua segunda exibição, chegaram a registrar maior audiência que a inédita novela das seis da Globo, criando um problema entre a emissora e seus anunciantes. Isso porque o anunciante da faixa de reprises está desembolsando muito menos dinheiro do que quem anuncia às seis da tarde. Deve-se levar em conta que, ao menos em tese, não se trata do mesmo perfil de telespectador: a audiência que compõe o prime time (ora ampliado, comportado entre as seis da tarde e a meia-noite) possui maior renda e se interessa por uma diversificada gama de produtos e serviços. Como grau comparativo, o valor de tabela de um anúncio de 30 segundos em rede nacional, exibido no início do prime time da Globo, estava fixado em 350 mil reais em 2010. Em contrapartida, no Vale a Pena Ver de Novo o anunciante podia ter seu produto anunciado por 35 mil reais. Preços de tabela, logicamente, que são devidamente barganhados pelas agências conforme a quantidade de inserções e outras infinitas variáveis.
Revelando o Oriente desconhecido
O ineditismo das temáticas que a autora ofereceu para cada núcleo foram os pontos fortes da novela. Além da clonagem humana, a história abordou os conflitos culturais entre brasileiros e muçulmanos; o tráfico de drogas, que contou ainda com depoimentos de ex-dependentes químicos; e o islamismo, hoje posicionado como a segunda maior religião do mundo, registrando 1,4 bilhão de seguidores.
O Clone foi produzida com muito cuidado, recebendo toda atenção que merecia. Para as gravações em Marrocos, por exemplo, a Globo fez questão de enviar uma equipe inteiramente masculina, a fim de diminuir ao máximo eventuais conflitos na região. Durante a pré-estreia, a Globo realizou forte campanha institucional, encomendando aos seus programas jornalísticos reportagens sobre temas abordados em O Clone. Menções sobre clonagem e curiosidades sobre a religião muçulmana eram bem-vindas. Na semana que antecedeu a estreia da novela, um Globo Repórter sobre os avanços da ciência no âmbito da clonagem humana também foi exibido.
Nos momentos finais, como os resultados estavam além das expectativas dos executivos da Globo, a emissora resolveu esticar O Clone em um mês. Criou barrigas para conflitos paralelos que já estavam em desenvolvimento até que o produto totalizasse 221 capítulos. Mesmo com as idas e vindas de Jade (Giovanna Antonelli) e Lucas, a história não se acomodou e a novela das nove hipnotizava o país. Seu último capítulo, exibido em 14/06/02, obteve 64 pontos de audiência; e numa média de toda sua exibição, registrou 47 pontos. No fim dos trabalhos, pode-se avaliar que O Clone foi um folhetim multifacetado. A competência de Glória Perez soube revelar o Oriente desconhecido pelo telespectador brasileiro, ainda traumatizado com a midiatização em escala global das ações terroristas de 11/09.
Os dependentes químicos
Como característica principal de suas novelas, Glória Perez investiu no chamado merchandising social. Ainda que esta terminologia se apresente muito mais como uma estratégia ideológica da Globo, no sentido de reforçar seu comprometimento como empresa de comunicação, cabe resgatar brevemente algumas ações de O Clone que ultrapassaram os limites de um produto de ficção e efetivamente alcançaram visibilidade social.
Retratar a vida de dependentes químicos foi um dos pontos altos. A personagem Mel (Débora Fallabella), inicialmente deprimida e depois revoltada com a vida, unindo-se aos seus amigos Cecéu (Sérgio Marone) e Nando (Tiago Fragoso) para consumirem drogas, ampliou o debate desta problemática que hoje atinge todas as classes sociais. Com mesma temática se apresentou Lobato (Osmar Prado), um homem de meia-idade viciado em álcool. As cenas de desespero e violência destes personagens, lutando para a manutenção de seu vício a qualquer preço, foram méritos absolutos do diretor e sua equipe, composta pelos profissionais Marcos Schechtman, Mário Márcio Bandarra, Marcelo Travesso e Teresa Lampreia. Reconhecimentos para O Clone não tardaram, com homenagens da Associação Brasileira de Alcoolismo e Drogas (Abrad) e um prêmio concedido pelos órgãos norte-americanos Federal Bureau of Investigation (FBI) e pela Drug Enforcement Administration (DEA), dois dos principais responsáveis pelo controle do tráfico de drogas naquele país.