Por Carlos Castilho
A imprensa sempre foi um protagonista relevante em eleições no Brasil, mas, até agora, a sua participação era menos importante do que o posicionamento dos candidatos. As polêmicas sobre o papel da midia se limitavam à sua estratégia editorial. Os candidatos faziam as denúncias e os jornais, revistas, TV e rádios repercutiam.
Em 2010 surgiu um novo enfoque na questão do protagonismo eleitoral da imprensa, pois ela passou a ser percebida como um partido de oposição. Esta percepção é uma consequência do fato de as denúncias terem sido feitas primariamente por orgãos da imprensa, cabendo a repercussão posterior aos candidatos.
Esta inversão de papéis é uma das causas do surgimento da idéia de que a publicação de escândalos de corrupção e de abuso do poder durante a campanha eleitoral de 2010 teria sido o resultado de uma operação coordenada, que equivaleria a uma ação típica de um partido político.
É importante ressaltar que tudo isto ocorre no terreno da percepção, ou seja, a forma como as pessoas percebem fatos, processos ou dados por meio dos seus sentidos. Numa campanha eleitoral, as percepções são alimentadas basicamente pelos veículos de comunicação e pelos formadores de opinião.
Mesmo sendo imateriais, elas (as percepções) são usadas hoje como base para estudos sobre comportamento humano no mesmo pé de igualdade que os fatos concretos. Em politica é corrente o jargão de que as versões (as percepções) podem ser até mais importantes do que os fatos.
Esta "viajada" teórica visa mostrar como o protagonismo eleitoral da imprensa transformou-se num "fato", mesmo sendo fruto de uma percepção. E é isto que gera uma situação nova com desdobramentos imprevisíveis.
Se a imprensa não adotar comportamentos que desmanchem as percepções desenvolvidas durante a campanha eleitoral, a credibilidade e independência de alguns jornais, revistas e emissoras de rádio ficará abalada. Sem credibilidade, o negócio da imprensa perde o seu principal ativo.
A sociedade brasileira não pode abrir mão da imprensa porque ela faz parte do conjunto de meios que levam e trazem informação, para e do público. A internet ocupou um bom espaço daquilo que era uma espécie de monopólio da imprensa escrita e audiovisual, mas não é hegemônica e nem onipresente.
Assim, o que provavelmente começaremos a assistir, passadas as eleições e dependendo dos acontecimentos imediatamente posteriores, é um questionamento do papel das empresas jornalisticas no Brasil, num processo que não tem nada a ver com liberdade de expressão.
Muito pelo contrário, dependendo do tipo de questionamento e da reação dos principais grupos midiáticos do país, o processo pode gerar uma inédita revisão das relações entre empresas e consumidores de informação.
Ninguém quer a ditadura de uma única percepção da realidade — portanto, se as empresas jornalísticas desejarem continuar cumprindo o seu papel de provedoras de informação terão que colocar a diversidade informativa como um dos seus objetivos centrais. Isto pode ajudar a anular a percepção de que a imprensa transformou-se num partido político.
A diversidade informativa levará também as empresas a rever o seu relacionamento com o público, porque ele hoje não é mais um consumidor passivo de noticias, mas um protagonista proativo no processamento de informações — não apenas no papel de cobrador de serviços qualificados, mas também como de fornecedor de matéria prima informativa, como é o caso de alguns weblogs.
Fonte: Observatótio da Imprensa