segunda-feira, 6 de junho de 2011
Lista do Minicom reativa corrida para identificar políticos com outorgas
A divulgação dos sócios nos contratos de concessão de rádio e TV por meio de uma lista pelo Ministério das Comunicações (Minicom) deflagrou nova corrida para identificar políticos que integram os contratos em desrespeito a Constituição Federal. Até o momento os membros do Congresso Nacional são os mais visados por infringirem a Carta Magna de forma mais contundente, já que são responsáveis pelos processos de liberação e renovação das outorgas.
No projeto Excelências da ONG Transparência Brasil são identificados 69 parlamentares do Congresso com posse de licenças. Os dados foram obtidos nas declarações de bens à Justiça Eleitoral, a partir do que eles informam em seus perfis nas respectivas Casas legislativas e em outras fontes. O próximo que pode figurar nessa lista é o senador Aécio Neves (PSDB-MG) que depende de aval do Minicom para integrar diretamente o quadro societário da Rádio Arco-Íris ao lado de sua mãe e uma irmã. A rádio é associada à rede Jovem Pan e licenciada para operar em Betim, mas a sede é na capital Belo Horizonte.
O caso de Aécio é emblemático porque o fato dele entrar efetivamente na sociedade da rádio não impede de exercer influência desproporcional sob a programação. O Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social emitiu nota nesta terça-feira, dia 31 de maio, na qual reivindica revisão dos artigos da Constituição que impedem a posse de concessão para políticos ao incluir proibição explicita também a cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau. No caso dos membros do Congresso o Intervozes reforça o argumento da ilegalidade ao alegar nepotismo.
Falta transparência
O Consultor Internacional da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Toby Mendel, ao analisar o panorama brasileiro, identificou a necessidade de coibir a propriedade de fachada das emissoras e foi explícito sob caso evolvendo familiares, no Seminário Internacional Convergência de Mídias em novembro de 2010. Mendel citou a impossibilidade de definir quando familiares atuam de forma conjunta para controlar o conteúdo das emissoras e os impactos negativos desse modelo na concentração da propriedade dos meios de comunicação no país.
A professora da Pós Graduação da Escola de Comunicação da UFRJ, Suzy dos Santos, endossa o coro daqueles que encontram dificuldades para encontrar os reais donos das empresas de radiodifusão brasileiras. Ao analisar a nova lista publicada pelo Minicom, Santos já conseguiu identificar problemas que atrapalham a transparência, como: a ausência das percentagens de cotas dos acionistas; o fato da relação das entidades por localidades não separar ativos e inativos; a falta de informações sobre os prazos das concessões; e o fato dos nomes das entidades ser apenas pela razão social e ocultar o nome fantasia.
Além desses entraves, Santos também cita erros na lista, como o fato da TV Itapoan na Bahia ter o falecido senador Antônio Carlos Magalhães como sócio: "Mesmo se atualizassem para espólio, é uma TV que ele perseguiu".
Em relação à lista publicada e retirada em 2003, ela vê poucas diferenças entre as quais a qualidade da diagramação e o fato de atualizar alguns falecidos para espólio, como é o caso do Pedro Affonso Collor de Mello nas empresas da família Collor em Alagoas.
Parentes são incluídos nos trabalhos da pesquisadora, bem como deputados estaduais, prefeitos, vereadores, suplentes de senadores e líderes partidários. Ela acha que nessa linha consegue algo mais abrangente, apesar das dificuldades nos atuais mecanismos de busca: "O maior problema é detectar afilhados e parentes. Também continua o problema das associações que só vêm com diretores e não com todos os associados".
Os dados utilizados por Suzy Santos para sua tese de doutorado defendida em 2004 apontavam que 33,6% das geradoras e 18,03% das retransmissoras são controladas por políticos, na maioria, dos partidos PMDB, PSDB e DEM. Já o projeto Excelências identifica 51 deputados estaduais em atividade que detém concessão de rádio e/ou televisão em 22 casas legislativas.
Atualmente Santos busca atualizar seus números sobre políticos com outorgas e aprofundar a compreensão sobre fluxo entre radiodifusores regionais e o poder federal. Porém a pesquisadora deixa o alerta que o foco nos números pode escamotear uma visão mais complexa do fenômeno: "Não dá pra simplesmente entender que o poder da radiodifusão nas mãos dos políticos se dá apenas pelas outorgas que eles detêm, temos que perceber que há alianças mais fortes neste processo".
Velocidade
É possível mensurar a velocidade com que os dados nesse campo são alterados nas reuniões da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados. No último dia 1 de junho, quarta-feira, foi aprovada por unanimidade na Comissão a renovação de duas concessões cujos sócios são políticos. A primeira é a da Rádio Pérola do Turi, no município de Santa Helena (MA) tem como sócia a prefeita da cidade, Helena Maria Lobato Pavão. A outra é a da Rádio Tempo FM de Juazeiro do Norte (CE) tem como sócio o 1° vice-presidente do PMDB-CE, Gaudêncio Gonçalves de Lucena.
O deputado federal Emiliano José (PT-BA) reforça os problemas deste tipo de associação: "existe um claro abuso no mundo das emissoras de rádio e televisão pelos políticos locais. A gente sabe que quando políticos detêm concessões públicas de radiodifusão, os veículos de que eles são sócios só vão defender seus interesses, esmagando outras opiniões".
Emiliano integra a coordenação da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e Direito à Comunicação e responsabiliza a fragilidade da legislação por perpetuar essa anomalia: "Isso acontece porque há brechas na legislação quanto às concessões. O Congresso precisa se debruçar sobre esse assunto para criar mecanismos legais que impeçam esse uso inapropriado das concessões públicas de radiodifusão".
Fonte: Observatório do Direito à Comunicação
quinta-feira, 5 de maio de 2011
Governo vai mudar procedimento para novas outorgas de rádio e TV
Em face às constantes comprovações de que muitos concessionários de rádio e TV utilizam o nome de terceiros como dirigentes de suas empresas para burlar a lei, o Ministério das Comunicações (Minicom) afirmou que irá adotar novos procedimentos para evitar que a prática continue a ocorrer no país. Elas servirão, segundo o Ministério, para comprovar a capacidade financeira dos grupos que concorrem nas licitações pelos canais. Enquanto isso, todos os pedidos de novas concessões estão suspensas no Executivo e no Legislativo.
Duas novas medidas são referentes à caução que as empresas pagam para participarem de uma licitação. Primeiro, o Minicom afirma que vai aumentar essa garantia de 0,5% para 20% do valor do contrato. Além disso, o governo também vai revisar o Decreto nº 52.795, de 1963, para fazer com que as empresas antecipem as cauções. Metade do valor será pago no ato da outorga e a outra parte no ato das assinaturas, após aprovação do Congresso. Atualmente a segunda parcela só é depositada um ano depois da assinatura dos contratos.
Outra cobrança que o Ministério garante que vai fazer é exigir a apresentação por parte do interessado no canal de pareceres de dois auditores atestando que a empresa tem condições de pagar a outorga e montar a estrutura de operação da emissora. Existem, atualmente, 800 processos de licitação suspensos no Minicom
Essas novas exigências do governo foram impulsionadas por material feito pela jornalista Elvira Lobato publicado na Folha de S.Paulo, em 27 de março deste ano, demonstrando que pessoas sem condições financeiras, como donas de casa e cabeleireira, emprestavam seus nomes para empresas que dirigiam as emissoras de fato. O valor de concessões de rádio e TV passa dos milhões de reais em muitos casos.
Grupos utilizam “laranjas” para escamotear os reais proprietários de um canal porque vários já possuem outros meios de comunicação, evitando assim a constatação que contribuem para o oligopólio no setor. Outros utilizam desse recurso para ocultar as movimentações financeiras, como a venda irregular da concessão. É comum políticos e igrejas por trás desse tipo de fraude.
A denúncia da Folha de S.Paulo não é nova e esse tipo de operação é tão comum que é possível encontrar sites especializados nesse comércio. Apesar de permitir o lucro de entes privados a partir de um bem público, a lei permite que emissoras sejam vendidas após cinco anos de funcionamento.
No entanto, o Decreto 52.795/63, em seu artigo 90, afirma que nenhuma transferência pode ser feita sem prévia autorização do Governo Federal sendo nula, de pleno direito, qualquer transferência efetivada sem observância desse requisito . Na prática, o que ocorre é que as empresas que cometem esse tipo de ilegalidade vendem suas emissoras por contratos de gaveta entre as partes, sem o conhecimento do Minicom.
Fiscalização
Os novos procedimentos anunciados pelo governo para concessão das outorgas só valem para os novos pedidos. Mas pouco terão efeito se a falta de fiscalização no setor continuar possibilitando essas e outras irregularidades dos concessionários. Esse é um dos maiores nós do setor no país.
Tanto que só agora, depois de 13 anos em que são outorgadas concessões por licitação no Brasil, é que o Minicom entrou em acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) sobre o papel de cada órgão no que diz respeito à fiscalização das emissoras. “Isso para mim é crítico”, diz o professor de comunicação aposentado da UnB, Venício A. de Lima.
O que o Ministério das Comunicações tem defendido é que não cabe a ele encontrar casos de fraudes nas composições societárias das emissoras. “Nada podemos fazer a não ser encaminhar ao Ministério Público Federal para investigar. Uma vez comprovada a fraude, podemos atuar”, disse em audiência pública no Senado, em 27 de abril, o secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica do Minicom, Genildo Lins de Albuquerque Neto. “Queremos que em quatro anos todas as rádios e televisões do país passem por uma fiscalização”, emendou.
O subprocurador-geral da República, Antônio Carlos Fonseca, afirmou, na mesma audiência pública, que o Ministério Público Federal (MPF) está investigando as denúncias feitas pela Folha de S.Paulo. Ele aproveitou para criticar a atuação do governo na fiscalização da radiodifusão. “Primeiro é um problema de uma legislação ineficiente e depois um problema de gestão. A sociedade está no pior dos mundos”, criticou o representante do MPF.
O professor Venício Lima avalia que as novidades que o Minicom anunciou são importantes, mas ainda são tímidas em relação ao tamanho das mudanças necessárias para o setor. Ele chama atenção, por exemplo, que atualmente uma concessão de radiodifusão é concedida àquele grupo que apresenta a maior proposta financeira. Pouco se leva em conta o uso que o interessado prentede fazer do canal. Além disso, as poucas exigências de conteúdo acordadas nos contratos não são fiscalizadas pelo Executivo e o Legislativo.
O Ministério também estuda consultar os dados da empresa participante de uma licitação de rádio e TV junto à Receita Federal antes de conceder a outorga. “Isso é óbvio. Nosso imposto de renda tem esses cruzamentos. Como isso ainda não tinha ocorrido?”, questiona o professor. “A impressão que tenho é que a equipe do Minicom está trocando o pneu com o carro andando. Não conhecem bem a legislação”, arremata.
Marco legal
Várias medidas que a nova gestão do Minicom vem implantando são mudanças de procedimentos internos e, na maioria dos casos, não necessitam de alterações legais. As mudanças mais significativas para o setor de radiodifusão, no entanto, estão sendo esperadas na proposta de revisão do marco regulatório, que o ministro Paulo Bernardo afirmou colocar em consulta pública e enviar para o Congresso no segundo semestre deste ano.
Enquanto isso não ocorre, deputados e senadores vem se movimentando para sugerir algumas mudanças nos critérios de concessão e renovação de outorgas. Após as denúncias da presença dos “laranjas” nos canais, as comissões que aprovam as outorgas nas duas casas suspenderam o trâmite dos processos.
Um grupo de senadores deve apresentar nesta quarta-feira (4) algumas dessas propostas. O senador Walter Pinheiro (PT-BA) adiantou que pretende apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição que diminua o quórum exigido para a negação de um pedido de renovação de concessão para a maioria simples dos presentes em plenário. Hoje, o parágrafo 2º do Artigo 223 da Constituição diz que a não-renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal.
Outra mudança que Walter Pinheiro pretende sugerir será para alterar o parágrafo 4º do Artigo 223, que garante que o cancelamento da concessão ou permissão, antes de vencido o prazo, só poderá ser feito mediante decisão judicial. O senador entende que o Congresso também tem o respaldo para tal ato e não apenas a Justiça. Além de Pinheiro compõem o grupo responsável por elaborar as propostas os senadores Aloysio Nunes (PSDB-SP) e Valdir Raupp (PMDB-RO).
Já a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara (CCTCI) pretende já nesta quarta voltar a apreciar os pedidos de renovação de concessões que estavam paralisados desde abril. As novas outorgas de emissoras comerciais, porém, não serão votadas até que o Minicom publique nova portaria regulamentando o procedimento licitatório, conforme anunciado. Assim, cerca de 150 dos 197 processos de radiodifusão devem ser aprovados nesta quarta.