Diversos países vêm implantando medidas para a restrição da propaganda infantil, como a Suécia, que baniu este tipo de propaganda em 2004. Estudiosos da área justificam tais restrições baseando-se em: 1) questões neurofisiológicas, pela menor capacidade de discernimento e julgamento em crianças abaixo de 12 anos; 2) questões de saúde, relacionadas ao aumento da prevalência da obesidade infantil; 3) o fracasso da autorregulação dos setores de marketing e propaganda; e 4) questões sociológicas e ecológicas que problematizam os modos de vida atuais e os problemas coletivos gerados pelo estímulo exacerbado ao consumo.
No Brasil, vem sendo discutido o Projeto de Lei 5921/01, aprovado pela Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados em 9 de julho de 2009, que visa à restrição da propaganda infantil e tramita em caráter conclusivo para a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Entre as restrições incluídas nesse projeto de lei constam a promoção de competições ou jogos nas escolas, foco desta discussão.
Embora diversas entidades defensoras dos direitos das crianças e adolescentes aprovem esse projeto de lei, muitas escolas de Porto Alegre e de outros lugares estão na contramão dessa discussão ao permitir a realização de jogos e competições promovidos por empresas (sobretudo de bebidas não alcoólicas como refrigerantes, repositores hidroeletrolíticos e alimentos de qualidade nutricional questionável) cujo objetivo subliminar é propagandear seus produtos entre o público infanto-juvenil.
Noções de cidadania
A conivência de instituições escolares com a propaganda infantil leva a questionar seu papel educativo no sentido de uma formação mais crítica. Escola é para estudar e aprender a pensar, e não para promover produtos de consumo. Para isso já bastam os meios de comunicação que temos em casa e os demais espaços que freqüentamos por livre escolha, como shoppings e supermercados, além das ruas abarrotadas de outdoors.
Tendo vivenciado na própria carne a propaganda infantil na escola de meus filhos caçulas, fiquei surpresa com a naturalização e despreocupação de alguns pais ante tais questões. Ou seja, a entrada da propaganda infantil não depende apenas da pressão das empresas e da conivência das escolas, mas também da anuência dos próprios pais, que permitem tal situação.
Dificilmente os beneficiados direta ou indiretamente com esse tipo de propaganda tentarão evitar sua entrada nas escolas. Mas se os benefícios parecem óbvios para as empresas que as promovem, por tentar conquistar um público jovem e consumidor de longo prazo, são escusos às escolas que permitem tais atividades em troca de material esportivo ou outras benesses. Além disso, que benefícios poderiam obter as crianças e adolescentes? E os pais que permitem tais atividades?
Escola não é shopping center e cabe aos pais e mães acompanhar e fiscalizar o que se passa nelas. Mas cabe também às próprias escolas garantir os direitos e a proteção de suas crianças e adolescentes restringindo a realização de propagandas em um espaço que deveria ajudar a repensar nossas relações com o mercado e nossos processos de consumo. Escola também é lugar para aprender noções de cidadania e esse sentido precisa ser resgatado na instituição escolar.
Leia tambémUma concepção de educação em jogo – Michelle Prazeres
Fonte: Observatório da Imprensa