Por Valério Cruz Brittos e Nadia Helena Schneider*
A forte concentração dos meios de comunicação de massa representa um obstáculo para que o país se reconheça enquanto nação plural, comprometendo a diversidade informativa e cultural. Ante tal cenário, é relevante uma ampla discussão, com a participação de todas as visões presentes na sociedade, sobre o papel do Estado como esfera de regulação e fomento do sistema comunicacional. Isso porque cabe ao ente estatal definir políticas públicas de comunicação, educação e tecnologia, assim combatendo ações homogeneizantes e auxiliando na construção de processos midiáticos que permitam ao Brasil compreender-se em sua totalidade e desenvolver-se enquanto país de muitos rostos e vozes.
Nesse sentido, a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) é um importante espaço de reflexão sobre as políticas de regulação da mídia, sobretudo das operações sob concessão pública (rádio e televisão abertos). Entre outros propósitos, a Conferência deve trazer à tona diferentes pontos de vista, revelando ser indispensável definir responsabilidades com a informação pública de qualidade, assim como o caráter educativo que nela deve estar presente, construindo uma agenda não-mercadológica a ser seguida pelos veículos.
A relevância da discussão desde o ângulo educacional pauta-se na constatação do grande público das indústrias culturais, em especial da TV, e da inegável força da mídia como produtora de sentidos e significados, com repercussão generalizada. Portanto, há uma dimensão socializadora nas ações da mídia que não pode ser menosprezada, visto que ela legitima valores e estimula comportamentos, através de seus programas, imagens e mensagens, ocasionando uma reconfiguração sócio-cultural, da qual faz parte.
Interatividade e Canal da Educação
A partir deste aspecto, é primordial, frente às mudanças provocadas pela digitalização, refletir como estão sendo desenvolvidas as políticas públicas e como devem ser definidos novos marcos regulatórios, para superar a concentração oligopólica e estimular os meios a cooperarem na promoção de melhorias do processo educacional, minimizando as desigualdades sociais. O Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD) tem papel a cumprir na inclusão social dos cidadãos, na democratização da radiodifusão e na criação de uma rede universal de educação à distância, metas previstas no Decreto Presidencial 4901.
Tais objetivos consideram a relevante presença dos elementos midiático-tecnológicos na sociedade, que vêm transformando o modo dos indivíduos comunicarem-se, relacionarem-se e construírem conhecimentos, movimento potencializado com a digitalização. A escola, como espaço formal de educação, não pode ficar alheia a essas mudanças, sendo relevante refletir sobre a integração dos meios de comunicação no espaço de ensino e aprendizagem, em sua dimensão de ferramenta pedagógica para promover uma educação para e pela mídia. Pensar a responsabilidade social midiática exige uma reflexão sobre a importância de políticas públicas que também contemplem a educação nas áreas comunicacionais, valorizando a formação dos cidadãos e evitando que os meios funcionem basicamente como mecanismos favorecedores da dinâmica de acumulação de capital, beneficiando uma minoria.
A discussão sobre a TV digital merece atenção especial, dadas as perspectivas que se abrem ao campo educacional. No sentido de promover a educação diante das inovações tecnológicas, duas são as expectativas voltadas para a operação da televisão digital: a possibilidade da interatividade, citada no artigo 6 do Decreto 5.820, que implantou o Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T); e a abertura do Canal da Educação, mencionado no artigo 13 do referido diploma legal, atualmente em fase de planejamento, sob a coordenação do Ministério da Educação (MEC).
Compreensão, tecnologia e capacitação
A interatividade, uma característica dos novos meios digitais, vai ao encontro da necessidade de inovações nas práticas pedagógicas. A capacidade de interação entre o telespectador e a emissora e a convergência com outros aparelhos abrem ainda mais o leque de opções aplicativas de uso e propiciam o vislumbre preliminar de quais seriam os recursos que poderiam ser explorados nos processos de ensino-aprendizagem, na apropriação dos elementos de linguagem e nas alternativas técnicas para produção e transmissão do conhecimento.
Pensar um canal educativo público aberto, com lógicas não-comerciais, portanto, comprometido com a variedade cultural do país, a produção audiovisual nacional e um jornalismo plural, tem uma função importante na construção educacional da sociedade brasileira. Diante do exposto, aprofundar a discussão sobre a democratização da comunicação na Confecom é simultaneamente falar de cultura humana, economia, política, educação e desenvolvimento tecnológico, dentre outros temas que permeiam os espaços midiáticos. É ainda uma tentativa de assegurar bases democráticas para as mídias eletrônicas, na busca de atualização da legislação, defasada no passar de décadas.
Concluindo, é importante ressaltar que educar através das novas mídias exige que educadores e comunicadores abracem alguns objetivos comuns: a compreensão intelectual dos meios, o domínio da tecnologia e a capacitação para sua utilização livre e criativa. O caminho de promover uma educação pela mídia significa tanto comprometer emissoras a ofertar mais e melhores programas ao público, quanto lutar por mais canais educativos no sistema aberto de televisão.
*Respectivamente: Professor titular do programa de pós-graduação da Unisinos e Professora na rede municipal de Dois Irmãos (RS), membro do Grupo de Pesquisa CEPOS (apoiado pela Ford Foundation) e mestre e doutoranda em Ciências da Comunicação da (Unisinos).
Fonte: Observatorio da Imprensa