Por João Miguel
A novela Os mutantes da Record tornou-se, nos últimos dias, assunto polêmico entre os moçambicanos, especificamente aqueles que recebem o sinal da Televisão Miramar, a filial da emissora brasileira em Moçambique. Na blogosfera também está acesa a discussão em torno da temática.
Inicialmente denominada Caminhos de coração, a novela tem conseguido arrebatar o público que costumeiramente assiste à teledramaturgia da Globo veiculada, tanto pela Televisão de Moçambique – TVM (as novelas mais antigas), quanto pela SOICO Televisão – STV (as novelas mais recentes).
O posicionamento dos que, por lado, não encaram positivamente o produto (inclusive em termos estéticos) está fundado na possível influência exercida no comportamento infantil. São vários os exemplos contados de crianças que mordem as outras, numa clara imitação daquilo que a TV lhes oferece.
Certamente não haveria nenhum problema se Os mutantes fossem ao ar apenas das 20 horas e 45 minutos às 22 horas, tendo em consideração que a faixa etária que não pode estar exposta a este tipo de programa estaria, nesta altura, longe da telinha. Porém, a TV Miramar presenteia aos seus telespectadores, aqueles que por qualquer motivo perderam o capítulo anterior, com uma reprise (recurso usado por todas as TVs do país) no dia seguinte, das 15 horas e 45 minutos às 16 horas e 45 minutos, justamente num período em que a maior parte dos pais está fora de casa.
Por outro lado, posicionam-se aqueles que defendem a “livre expressão” e que colocam nos pais a responsabilidade de educar seus filhos, inclusive o cuidado de os não deixar expostos aos produtos inadequados para sua idade. Verdade é que os pais têm o dever legal e moral de proteger suas crianças, mas essa tarefa também é extensiva ao Estado. Além do mais, é papel da entidade estatal estabelecer limites através dispositivos legais para proteger os cidadãos e evitar os excessos cometidos, neste caso, pela busca da audiência ou talvez pela falta de estratégia e criatividade.
Não se pode perder de vista que as emissões televisivas (que usam o espaço hertziano, um bem comum), diferentemente da imprensa escrita, dependem de uma concessão pública para atender não apenas aos motivos mercadológicos, mas também aos interesses da sociedade como um todo.
Um dado importante na polêmica sobre Os mutantes é o fato de setores da sociedade moçambicana discutirem a atuação da mídia, um gesto fundamental para o andamento das democracias hodiernas.