Por Leonardo Pereira
O Netflix chegou ao Brasil na semana passada causando pânico em setores como o de TV paga. Lá fora, a locadora virtual é vista como ameaça à rede HBO e já foi apontada como responsável pela falência da Blockbuster, além de ser temida pelos grandes estúdios de Hollywood. Aqui o modelo já havia aportado antes com a NetMovies, mas só agora parece que "caiu a ficha".
Um dos mercados que poderiam ser atingidos diretamente é o de locadoras físicas, que em apenas seis anos perdeu mais da metade de seus estabelecimentos: das 4 mil lojas existentes em 2005, sobraram apenas 1850. Dentre as causas está o forte crescimento da pirataria e do download ilegal, mas as locadoras virtuais não representam mais uma ameaça, segundo o presidente do SINDEMVIDEO (Sindicato das Empresas Videolocadoras do Estado de São Paulo), Luciano Tadeu.
"De forma nenhuma. É sempre vista com bons olhos, porque é mais uma concorrência", disse ao Adnews sobre a investida do site no Brasil. "É mais um desafio, mas tem custos: de uma banda larga, de uma locação... Na verdade, ela é mais uma loja, é como se aumentasse a quantidade. Funciona como se fosse a Blockbuster entrando no país, é uma concorrência sadia."
Tadeu diz que não há vantagens para as locadoras investirem na oferta de streaming, pois os custos são muito elevados. Assim como não há possibilidade de uma aliança com sites como Netflix e NetMovies, o que pode acontecer é as grandes redes se unirem para tentar algo nesse sentido.
Por que assinar?
Cinéfila assumida, a mestranda em Literatura Russa da USP Flávia Cristina Silva usa o serviço desde a entrada no país e, com base no que viu ali, discorda de Tadeu. "Acho que agora é o fim das locadoras físicas oficialmente", afirma, completando que é preciso se adaptar aos novos tempos. Ela, que assiste a uma média de dez filmes por semana, considera um "abuso" ter de pagar os cerca de R$ 8 cobrados nas locadoras físicas por cada título. O Netflix oferece todo o conteúdo por R$ 14,99 mensais; o problema, comenta Flávia, é a quantidade.
"Achei o acervo bem pobre, não consegui encontrar diretores russos, nada de novelle vague, nada do Woody Allen, quase não tem cinema europeu etc.", critica. "Ainda é cedo para analisar. De início, ganhamos com o preço, com a praticidade e vai ter uma grande diminuição da pirataria, com certeza."
A jornalista Cristiane Joplin também vê a questão do preço como ajuda ao fomento da locação virtual, que ainda cativa pela comodidade. "Hoje se você quer assistir a algum filme que não esteja em cartaz, as opções para se conseguir são complexas ou escassas; se decidir baixar da internet, os filmes, na grande maioria, têm qualidade ruim e ainda a questão das legendas."
"Se optar por alugar, tem de ir até uma ‘2001’ ou qualquer locadora especializada e desembolsar a bagatela de R$ 8 a R$ 10, por isso acho um ótimo negócio a locadora online, afinal, o mundo roda em torno da rede e, assim como os livros, que têm suas versões na internet, chegou a vez das locadoras", sentencia.
Vai pegar?
Para o presidente do SINDEMVIDEO, a Netflix vai penar muito no Brasil por conta da banda larga fraca do país. A empresa, afirma, não conseguirá atender aqui com a mesma eficiência conseguida nos Estados Unidos, pois, diferente de lá, a internet de alta velocidade brasileira pertence a uma camada mínima da população. Ele tem a mesma opinião do fundador da locadora, Reed Hastins, que já reconheceu as dificuldades a serem enfrentadas.
Outro entrave ao modelo virtual é o romantismo perdido com a falta de um espaço físico, que possui atendentes não-automatizados e possibilita o contato com outras pessoas. Nos EUA, por exemplo, já há um movimento de retomada das locadoras tradicionais. "Elas estão se recuperando porque o consumidor chega a um ponto em que acaba se cansando só do virtual. Ele quer pegar o filme na mão, movimentar aquilo", diz. "E o brasileiro é muito mais sensitivo do que o americano. Há uma tendência de volta."
"Tinha uma locadora do lado de casa e era um evento escolher os filmes e passear pelas prateleiras, reservar, receber ligação dizendo que aquele filme que você tanto queria chegou", lembra Cristiane. "Um dia eu fui a essa locadora e ela estava vendendo todos os filmes a R$ 10. Os clássicos queridos que eu assisti por R$ 4,50 estavam disponíveis. E a placa anunciava: ‘em breve, lan house’."
"Ou seja", continua, "nosso filhos não vão passear pelas prateleiras".
Fonte: Adnews