Por Valério Cruz Brittos e Diego Costa
Em meados dos anos 2000, houve uma mudança significativa no mercado televisivo brasileiro envolvendo as emissoras concorrentes diretas à liderança da audiência. A disputa Globo e SBT, que imperou nas décadas de 80 e 90, foi superada, com a Record assumindo a segunda posição, no lugar da rede de Silvio Santos. Dispondo do apoio da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), a Record cresceu e seu sinal abrange atualmente 77,3% do território nacional, num processo de sedução econômica de afiliadas.
Embora neste momento a Globo não tenha seu império ameaçado, pois é líder em praticamente todas as faixas de horário, a Record desponta no segundo lugar utilizando os mesmos artifícios do grupo televisual fundado por Roberto Marinho para conquistar o público. Contratando atores da emissora líder por salários elevados, perseguindo o padrão tecno-estético global e com sua grade de programação nos mesmos moldes, esta estratégia, bem-sucedida até o presente, chegou ao campo (ou ao tapetão) do futebol.
Com a entrada da emissora liderada pelo bispo Edir Macedo na disputa da licitação para transmissão dos jogos do Campeonato Brasileiro para o triênio 2012-2014, o Clube dos 13 (entidade fundada em 1987 para defender os interesses políticos e comerciais dos 20 principais times de futeboldo Brasil) acabou implodindo, a Globo passou a negociar com os clubes individualmente e a RedeTV! formalmente venceu a licitação. Em síntese: a Globo reafirmou seu poder, influenciando os resultados desta dinâmica.
Um novo capítulo
Esta configuração confirmou que os grupos empresariais líderes têm um poder de influência que vai além de seu espaço econômico, no respectivos mercados em que atuam. Tratando-se de mercados de comunicação, isto é reforçado pela dimensão simbólica dos produtos que processam, permitindo múltiplas negociações com produtores, anunciantes e parceiros em geral, considerando sua presença junto aos receptores. No caso da televisão, tais poderes assimétricos multiplicam-se, tratando-se da principal mídia.
Nessa direção, faz parte do jogo do mercado a pressão de patrocinadores para que os clubes fechem contrato com a Rede Globo, a fim de que seus produtos tenham maior visibilidade. Com exposição numa janela como a Globo, os clubes e os próprios jogadores lucram muito mais, direta e indiretamente, tendo em vista o que isso repercute em seus ganhos e na possibilidade de fechar outros contratos, frente à força de suas imagens. Esse é um círculo difícil de quebrar, reafirmando o domínio da líder.
Ao mesmo tempo, com os direitos de transmissão assegurados para as Olimpíadas de 2012 e com o caixa pronto para fazer os investimentos necessários – em recursos humanos e equipamentos –, este novo capítulo reafirma a Rede Record como grande desafiante da Rede Globo, capaz de oferecer quantias acima do mercado para obter os conteúdos que decide investir. No entanto, ante o aporte econômico que dispõe e as relações que mantém, deve-ser reafirmar que é ingênuo ver a Record como uma alternativa não-hegemônica.
Fonte: Observatório da Imprensa