Por Luciana Coelho
Para especialista da NPR, rádio pública dos EUA, milhões no mundo árabe estão atentos ao que ocorreu no país. Andy Carvin agiu como "curador" de notícias nos 18 dias da revolta, filtrando e repassando informações on-line
BOSTON - Se havia dúvidas sobre o papel das mídias sociais nos movimentos populares recentes, os protestos que culminaram na queda do ditador Hosni Mubarak no Egito as dissiparam. Sobrou apenas a questão da dimensão. "Não dá para adivinhar o que vai acontecer daqui para frente, mas há dezenas de milhões de jovens no mundo árabe prestando muita atenção ao que acaba de ocorrer no Egito", diz Andy Carvin. Estrategista-sênior para mídias sociais na NPR, a respeitada rede pública de rádio americana, Carvin organiza comunidades on-line há mais de uma década. Durante a revolta, ativou contatos no Egito e tuitou 18 dias sem parar, atuando como editor-curador do noticiário -viesse ele de jornalistas ou ativistas, Carvin impôs um padrão de qualidade. A Folha conversou com Carvin por e-mail sobre ativismo, redes sociais, jornalismo e as formas como os três se interligaram no Egito.
Folha - Quão cruciais foram as redes sociais no Egito?
Andy Carvin - Não há dúvida de que tiveram um papel. Há anos existe um grupo de blogueiros dissidentes, tanto dentro quanto fora do Egito, que se comunica e comunica ao mundo seu desejo de mudança. Eles também usam o Facebook e o Twitter para atrair mais gente.
Claro, em última análise, a ação teve que acontecer no mundo real -protestos, ocupações-, mas parte dessas atividades foi organizada e difundida por mídias sociais.
O jornalista Malcolm Gladwell argumenta que as redes sociais não criam movimentos sozinhas se as condições para isso não existirem em campo. Afinal, elas são catalisadores ou detonadores?
Por centenas de anos, as revoluções usaram as ferramentas que tinham à mão para avançar. É esquisito argumentar que manifestantes não usariam a mídia social, que é a ferramenta de hoje.
Uma crítica ao Twitter é que muita gente fala e ninguém ouve. O assunto Egito dominou a rede por três semanas. O interesse o surpreendeu?
Passei quatro anos no Twitter cultivando fontes, interagindo com pessoas. Não estou surpreso. A diferença, desta vez, é que muita gente que eu retuitava estava envolvida na revolução. Virei um curador de informações.
Como foi lidar com essa quantidade de informação?
Sigo vários veículos de imprensa, e na maior parte do tempo estava com Al Jazeera ou CNN ligadas. Montei minhas listas de jornalistas no Egito, especialistas em Oriente Médio, ativistas etc., além de monitorar vídeos no YouTube e no Facebook.
Eu conhecia vários dos manifestantes egípcios havia anos, sabia que podia confiar neles. Em muitos casos, as pessoas em campo eram mais confiáveis do que os veículos, mas isso é anormal numa situação tão fluida.
Também pedi para citarem a fonte da informação. Ajudou a separar fato de boato.
Como você vê a interação entre jornalismo e Twitter?
A Al Jazeera tinha meia dúzia de jornalistas tuitando, e segui-los foi bem útil naqueles dias. A CNN, a ABC, a NBC [redes de TV americanas] e a NPR também tinham gente tuitando, embora menos. Muitos estavam usando o Twitter como ferramenta para reportagem; outros, para encontrar as pessoas dentro de seu processo de apuração.
Apesar de censuras e prisões, o Egito mostrou ter uma comunidade vibrante on-line. O que tornou isso possível?
Acesso à internet e um grupo de pessoas mais educadas e familiarizadas com tecnologia, que estava cheia desse regime havia muito tempo.
Que semelhanças essa comunidade tem com outras?
O Egito parece ser o país [da região] com a cultura de blogs políticos mais forte. Muito semelhante à Tunísia, mas em escala bem maior. Acho que isso fez diferença.
Fonte: FNDC