Por Sérgio Matsuura
Um documento divulgado pelo site Consultor Jurídico (leia aqui) sugere a existência de ligações entre profissionais de imprensa e o dono do Opportunity, Daniel Dantas. O material faria parte de um arquivo de oito gigabytes apreendido pela corregedoria da Polícia Federal em computadores e pen drives do delegado responsável pela Operação Satiagraha, Protógenes Queiroz.
Com o título de “Análise de dados: o caso Opportunity-Brasil Telecom”, o material diz ter identificado “a manipulação da mídia por grupos econômicos”. Entretanto, é feita a ressalva de que “tais acusações ainda estão sendo investigadas”.
“Há indícios de que Dantas tenha certa ascendência sobre alguns jornalistas e editores. Isso pode ocorrer mediante pagamento de subornos, embora não se descarte a possibilidade de recurso à chantagem ou coação, com base em informações pessoias de seus alvos de interesse, as quais ele obteria por meio de atos de espionagem clandestina”, diz o documento.
O material, com 84 páginas, é dividido em três partes. A primeira trata da análise de interceptações de e-mails e telefonemas realizadas, segundo o documento, com autorização judicial. A segunda é uma análise sobre o papel da mídia na queda do presidente do Senado Renan Calheiros. Apesar de não ter relação com o caso Dantas, analisa “o comportamento da mídia visando à compreensão de um modus operandi, o qual fora planejado e dirigido a um fim claro e específico”. A terceira parte mostra um levantamento de matérias publicadas pela imprensa sobre o caso Opportunity-Brasil Telecom.
O jornalista Marcelo Tognozzi é um dos apontados de terem supostamente cooperado com o grupo do banqueiro Daniel Dantas. Com base na interceptação de troca de e-mails entre Tognozzi e o sócio do Opportunity, Carlos Rodenburg, o documento afirma que o jornalista “repassou orientações sobre como se dirigir à sociedade, por meio da utilização da imprensa, manipulando a opinião pública”. As mensagens são de 2004.
Tognozzi realmente foi contrato por Rodenburg para realizar um serviço de consultoria. Entretanto, no material divulgado não existe nada que comprometa o profissional, além da prestação do serviço.
“Prestei consultoria ao Carlos há cinco anos. Fiz uma análise sobre o que saiu na mídia. O que tem de errado nisso? Eu acho que isso é um despropósito. Não tem cabimento”, afirma Tognozzi, que também aponta erros de apuração no relatório.
O documento informa que o jornalista desempenhou a função de vice-presidente da Associação Brasileira de Imprensa, quando, na verdade, ele é apenas conselheiro. O texto também diz, junto com a troca de e-mails, que Tognozzi trabalhou para o Correio Braziliense, dando a entender que poderia existir algum conflito de interesses. Porém, o jornalista desligou-se do jornal em 1995.
O executor do relatório, supostamente o delegado Protógenes Queiroz, parece não ter conhecimento profundo sobre o funcionamento do jornalismo. Por uma conversa telefônica interceptada entre o jornalista da IstoÉ Dinheiro Leonardo Attuch e a secretária do investidor Naji Nahas, conclui-se que: “Este diálogo é importante porque evidencia a existência de contatos entre o jornalista e Nahas, amigo e colaborador de Daniel Dantas”.
Sobre a jornalista da Folha de S. Paulo Elvira Lobato, é dito que “muito provavelmente (ela) seja uma das jornalistas de confiança de Dantas para implantar, na mídia, tais reportagens”. A dedução é feita a partir de uma conversa telefônica entre Nahas e “um indivíduo identificado como Paulo”.
“Ele chegou a essa brilhante dedução. Se tivesse lido as minhas matérias, não consideraria isso. Ele ia perceber que eu nunca escrevi nada que possa parecer, nem de longe, favorável ao Daniel Dantas”, afirma Elvira.
A jornalista esclarece que o tema em questão deva ser sobre um pedido de entrevista feito por ela ao então assessor de imprensa de Nahas, que se chamava Paulo. Entrevista esta que não foi concedida, como confirma o diálogo interceptado. A reportagem seria sobre as investigações que corriam na época sobre a Telecom Italia.
Nahas é apontado como sendo o suposto “intermediário em pagamentos feitos a jornalistas, em favor de alguém”. Tal afirmação é feita a partir de análise de conversa entre o investidor e uma secretária, sobre o pagamento de R$ 50 mil ao jornalista Roberto D´Ávila.
“Não se pode descartar a possibilidade de que essa pessoa seja Daniel Dantas e os profissionais de imprensa talvez estejam recebendo dinheiro para publicar ou divulgar matéria, entrevistas, notícias e reportagens favoráveis aos interesses do banqueiro e de seu grupo”, diz o documento.
Tal acusação também estava presente no relatório da Satiagraha. Na época, Cláudio Pereira, vice-presidente da CDN, empresa de D´Ávila, esclareceu que a remuneração se refere a uma pesquisa de imagem encomendada por Nahas à CDN Estudos e Pesquisas. Pereira informou ainda que a pesquisa foi feita e entregue, assim como qualquer outra.Na terceira parte do relatório, é apresentado um clipping sobre matérias publicadas pela imprensa sobre os negócios envolvendo o Opportunity e a Brasil Telecom. São citadas 34 matérias de 17 jornalistas. Os veículos incluídos no documento são: piauí, Carta Capital, IstoÉ, IstoÉ Dinheiro, Veja e Folha de S. Paulo. Além disso, também constam reportagens publicados pelos italianos Revista Panorama e Corriere della Sera e do inglês Financial Times.
Em outro documento, também divulgado pelo Consultor Jurídico, é informado o motivo do pedido de prisão da jornalista da Folha de S. Paulo Andréa Michael.
“Os jornalistas Andrea Michael e Hudson Correa anteciparam para os alvos informações sigilosas. E em conseqüência facilitou a fulga (sic) se realmente estivesse para ser deflagrada a operação”, diz o documento.
Entretanto, no mesmo relatório é dito que “o ‘vazamento’ sobre a investigação em andamento são sobre fatos desatualizados, anteriores aos investigados pelo atual grupo”. Também existe a transcrição de um telefonema entre Daniel Dantas e Guilherme Henrique Sodré Martins, onde está claro que foi feito, na realidade, um pedido de entrevista sobre o caso, fato natural no jornalismo.
“Ele me mandou aqui a série de perguntas”, diz Daniel Dantas em determinado momento da conversa. Em outro, diz: “O jornalista queria uma resposta, mas não vou responder não, porque agora não tem mais necessidade porque a gente já vendeu a Brasil Telecom para a Telemar”.
Fonte: Comunique-se