quarta-feira, 13 de julho de 2011

Globo cria novo horário de novelas para frear concorrência

Por Valério Cruz Brittos e Andres Kalikoske

Poucas vezes na história da televisão brasileira a Globo submeteu-se às programações de outras emissoras para compor sua grade. O crescimento da Record, iniciado em 2004 e impulsionado nos últimos anos, ao lado de eventuais atratividades do SBT, fizeram com que a Globo incorporasse a lógica praticada por concorrentes, expandindo o chamado prime time (horário nobre). Como não raramente ocorre na indústria do entretenimento, a salvação proveio do passado ilustre: O Astro, de Janete Clair, será o título responsável por inaugurar o novo espaço ficcional que a Globo passa a exibir a partir desta terça (12/7), às 23 horas.

A minissérie com elementos de novela estreia com uma frente de 12 capítulos gravados e 35 escritos, entre os 60 previstos para exibição até o dia 21 de outubro. Apesar do alvoroço em torno da comemoração dos 60 anos da telenovela no Brasil, a escolha de O Astro para o horário em questão é, na verdade, uma resposta da Globo ao aumento da concorrência. O programa – cuja denominação, pela própria Globo, oscila entre mininovela, macrossérie e especial – será exibido entre terças e sextas-feiras, devendo variar seu horário de entrada no ar, já que a previsão para a faixa das 23 horas é uma média.

Em sua primeira versão, o pioneirismo da autora, que adotou a claridade francesa como pseudônimo artístico, não ficou em segundo plano. O Astro de 1977 foi responsável pela popularização do “quem matou” nas novelas brasileiras, uma temática amplamente explorada por outros novelistas até os dias de hoje. A versão 2011 será uma adaptação de Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, com colaboração de Tarcísio Lara Puiati e Vitor de Oliveira. A essência da original será mantida, narrando a ascensão social de Herculano Quintanilha (Rodrigo Lombardi), um vidente charlatão de churrascaria que passa a ser o braço direito do empresário industrial Salomão Hayala (Daniel Filho). O encontro com o poderoso libanês muda a vida de Herculano: ele consegue aproximar-se da família Hayala, passando a exercer forte influência sobre os membros do clã.

O recurso à telenovela

O telespectador habituado com a exibição da tradicional novela das 21 horas já havia percebido, desde dezembro de 2010, um leve atraso no início de seus capítulos. Insensato Coração, por exemplo, desde seu lançamento tem sido atrasada e hoje chega a ser exibida até 20 minutos após seu horário programado, mas iniciando, em média, às 21h10. Tal estratégia foi desencadeada com a reprogramação do Jornal Nacional para as 20h30, buscando, desta forma, acostumar a audiência a permanecer até um pouco mais tarde em frente à televisão, contando com a fidelização do público consumidor de novelas.

Nos últimos sete anos, a Globo constatou a migração de sua audiência para outros canais após o término da novela das nove. O forte investimento em seriados na linha de shows, neste século, demonstrou que a emissora carioca não foi passiva. Os casos mais delicados ocorreram durante as exibições de Cidadão Brasileiro (2006), na Record, e a reprise de Pantanal (2008), no SBT. A investida da Globo em séries nacionais foi uma rápida resposta, porém mostrou-se insuficiente frente a alguns fracassos do gênero. Assim, recorreu novamente a uma telenovela (no caso atual formatada como minissérie), da mesma forma que fez entre outubro de 1990 e março de 1991, quando criou uma nova faixa novelesca e programou Araponga, para enfrentar a Manchete com o mesmo tipo de produto, já que, no período, aquela rede (hoje extinta) exibia Pantanal, o maior sucesso fora da Globo dos últimos 30 anos, veiculada de março a dezembro de 1990.

Mais minisséries-novelas

Ainda que na indústria televisiva o prime time seja conhecido como a faixa de programação mais importante de uma emissora, comportando os mais elevados investimentos de níveis técnico e artístico, a média de audiência diária tem se posicionado como um importante elemento verificador. Quando a disputa pela audiência é ponto a ponto – como ocorre nos períodos da manhã e tarde, entre Globo, SBT e Record –, a irrisória diferença de um ou dois dígitos na audiência pode definir qual emissora foi líder naquele dia. A Globo segue com larga vantagem, salva pela programação que exibe entre 18 e 24 horas. Mas não raramente a programação matutina do SBT atinge a liderança, nocauteando as demais; já a Record, também eventualmente atinge o primeiro lugar neste horário, especialmente quando prioriza a cobertura jornalística em seu Hoje em Dia.

No entanto, em grau comparativo, a Globo foi a única emissora que perdeu audiência em rede nacional durante o primeiro semestre de 2011, conforme dados do Plano Nacional de Televisão (PNT) e do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope). Houve uma queda de 7% em sua audiência de janeiro a maio, com 17,4 pontos. No mesmo período de 2010, foram registrados 18,8 pontos. Mesmo com as estreias de Lara com Z, Divã, Macho Man e Tapas & Beijos, o mês de abril foi especialmente amargo para a Globo. Em contraponto, os demais canais cresceram: Rede TV!, 4%; Record, 3%; SBT, 2%; e Band, 1%.

Até o momento, não há previsão de novo remake para quando O Astro terminar. A Globo planeja a segunda temporada de A Mulher Invisível na sequência, além de Força Tarefa, nas noites de quinta-feira, e a exibição da segunda temporada de Macho Man, às sextas-feiras. Mas isso poderá ser alterado, ante a dinâmica da decisão estratégica das emissoras, nesta Fase da Multiplicidade da Oferta das comunicações, havendo possibilidade de seguir programando minisséries-novelas no horário. No mercado internacional, O Astro deverá ser oferecida como minissérie. Trata-se de um formato que, por conter um menor número de capítulos e edição ágil, vem sendo bem aceito no exterior, onde o telespectador não está habituado a acompanhar histórias que se arrastem durante meses.

* Respectivamente, professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e doutorando em Ciências da Comunicação na mesma instituição.

Fonte: Observatório da Imprensa.