terça-feira, 6 de abril de 2010

Tecnologia para libertar a comunicação coletiva

Alguns avanços tecnológicos oferecem alternativas esperançosas para permitir a seleção de fatos noticiáveis a grupos de interesse não hegemônicos. Um deles é o que uma empresa universitária espanhola está desenvolvendo atualmente, a youlive internet broadcasting. Existe uma alternativa aos grandes meios de comunicação? Leia o artigo de Anto J. Benítez.

Por Anto J. Benítez*

Alguns avanços tecnológicos oferecem alternativas esperançosas para permitir a seleção de fatos noticiáveis a grupos de interesse não hegemônicos. Um deles é o que uma empresa universitária espanhola está desenvolvendo atualmente, a youlive internet broadcasting.

Existe uma alternativa aos grandes meios de comunicação? É possível produzir notícias audiovisuais com bons recursos de efeitos, dinamismo e frescor a custos tão baixos que possam se assumir sem publicidade? Poderia encontrar-se uma alternativa de comunicação a grupos de interesse diferentes dos que exercem a hegemonia da emissão de notícias?

Encontramo-nos em um palco comunicativo que se desenvolve, sem pausa e a uma velocidade fulgurante, ao amparo das novas tecnologias emergentes que permitem a produção de conteúdos com facilidade. Novas janelas para novos públicos, mas também, pela primeira vez, suficiente público interessado em cada uma dessas novas janelas. Audiências que até agora não têm sido levadas em conta como potenciais; janelas de resoluções e qualidades até agora descartadas.

Um grupo de investigação nórdico (ver Mobile Collaborative Live Video, assinado por Engström, Esbjörnsson, Juhlin e Norlin, 2008, em Mobile HCI) em associação com Ericsson, Microsoft Research, o governo da cidade de Estocolmo, Telia Sonera e com bolsas financiadas por Vinnova (Agência Governamental Sueca) está realizando interessantes avanços no campo da utilização colaborativa dos terminais móveis com câmeras de vídeo incluídas. Têm conseguido levar a cabo experiências em sessões de Vídeo Jockeys onde os celulares se repartiam entre os convidados à sessão, e as imagens que obtinham passavam a fazer parte do repertório que o VJ mostrava em projeções gigantes a todo o público presente, produzindo uma obra audiovisual que poderia se denominar coletiva.

Ainda neste sentido, mas sem relação com essa investigação, uma empresa espanhola surgida na Universidade Carlos III e que faz parte do Parque Científico de Madri, a youlive internet broadcasting, oferece a seus clientes a possibilidade de produzir e emitir programas ao vivo através do site, captando, com as câmeras de telefones celulares, seus eventos empresariais ou institucionais.

O sistema emprega as câmeras e microfones dos terminais para transmitir suas imagens e sons ao vivo pela rede de telefonia 3G, tornando desnecessária a utilização de cabos; a combinação desses sinais obtidos em trabalho coletivo é subida, ao vivo, por meio de um canal de transmissão de dados em tempo real (o chamado streaming) singular a qualquer site, com um retardo mínimo, mas com áudio e vídeo sincronizados.

Uma das possibilidades, denominada de associação simultânea, permite que um número de terminais de telefone celular se converta em unidades móveis para obter diferentes ângulos simultâneos e transmitir ao vivo através da Internet. Um bom exemplo de aplicação seria a visão alternativa de um despejo policial contra uma casa ocupada, enviando imagens desde o interior do lugar onde se desenrolam os fatos. Em outro dos desempenhos, o de associação sequencial, as câmeras de uma série de terminais podem ir se conectando e replicando imagens para aferir no momento exato, as reações da cidadania, ocorridas de forma simultânea em diferentes cidades e abordando o mesmo evento. Apenas para exemplificar essa possibilidade, se pode imaginar estas conexões em cascatas acontecendo, em sequência, de diferentes localidades, logo após um processo eleitoral.

Por um lado, o conceito de sem fio e a possibilidade de imediatismo e de flexibilidade das conexões conseguiriam que fatos noticiosos, até então tampados pela seleção dos grupos comunicativos hegemônicos, fossem acessíveis ao vivo; e ainda acrescentando-se a facilidade do manejo da câmera de um terminal móvel.

Por outro lado, a aparência inofensiva dos diminutos terminais pode ser aproveitada para que os repórteres que atuam em ação colaborativa se aproximem dos protagonistas dos fatos de forma pouco invasiva. Assim, se reduz ao máximo o princípio de incerteza social, ao mesmo tempo, a aproximação com a gênese da notícia se faz extrema. Desta maneira, torna-se viável uma espécie de guerrilha informativa contra o bloco hegemônico da distribuição da informação de atualidade. Recordemos que a transmissão ao vivo no padrão dos conglomerados exige uma notável infraestrutura ao alcance de poucos.

Em qualquer caso, o projeto de youlive supõe o desenvolvimento em médio prazo do software adequado a ser compartilhado gratuitamente, de forma que a oportunidade de postagens existirá a um preço não maior que o de transmissão de dados através das redes móveis e dos serviços streaming.

Como exemplo de aplicação livre e colaborativa destinada ao grande público, suponhamos uma página onde o usuário entra com intenção de transmitir ao vivo o casamento de um familiar. É perguntado a respeito do número de terminais simultâneos que vai utilizar, e proporciona ao sistema o número de telefone de cada um deles. A página questiona-lhe como desejaria publicar as imagens: ao vivo, em streaming; através de várias redes sociais; em diferido, diretamente no Youtube ou serviços parecidos. Uma vez completado o formulário, aperta-se o botão de executar, a plataforma marca os números indicados e liga, através da rede de dados disponível, as câmeras e os microfones da cada um dos terminais de maneira que o usuário monitora os sinais e combina-os à vontade ao longo do tempo de uso. Parece simples…

Toda hora é hora para sonhar, e mais ainda quando da realização dos sonhos pode se desprender uma possibilidade verdadeira de liberdade no manejo de ferramentas de comunicação coletiva.

* Anto J. Benítez. Realizador em Telemadrid (Televisão Pública de Madri). Membro do Grupo de Pesquisa TECMERIN da Universidade Carlos III de Madri, Espanha; sócio fundador de youlive internet broadcasting

Fonte: Revista IHU Online