Por Nadia Helena Schneider*
A televisão, mais do que uma tecnologia que transmite sons e imagens em movimento, voltada, principalmente, ao lazer, faz parte da cultura, e seu conteúdo serve de referência sobre a realidade social. Diante de tal fato, busca-se refletir sobre o cumprimento da finalidade educativa dos produtos audiovisuais, veiculados nesse meio de comunicação.
Atualmente, em diversos espaços, encontram-se discussões sobre a adequação da programação televisiva, seja em relação aos horários de exibição de determinados programas ou ao seu próprio conteúdo. Isto se dá, não só porque sua programação é a principal fonte de divertimento e informação da maioria das famílias brasileiras, mas, em especial, porque ela legitima valores e transmite ideologias, com a qual busca influenciar o imaginário social.
A história relata que a televisão emergiu de um esforço da iniciativa empresarial, fato que a consolidou como TV comercial. Sendo assim, sua lógica está mais orientada para a busca de audiência, não abrigando, em sua grade de programação, a preferência por ofertar conteúdos destinados, exclusivamente, à difusão cultural, educacional e à formação da cidadania em conformidade com a lei.
Quanto à programação televisiva, a Constituição de 1988, no artigo 221, determina que emissoras de TV deem “preferência a finalidades educativas, culturais e informativas”. No mesmo sentido, em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu artigo 76, diz que: “As emissoras de rádio e televisão somente exibirão, no horário recomendado para o público infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas”. Porém, grandes discussões são travadas a respeito do que tem sido chamado de programas educativos. Fato é que, para deter o descumprimento das leis que priorizam o enfoque educativo pelas emissoras de televisão, que seguem a lógica mercantil em detrimento, muitas vezes, da responsabilidade social, o Ministério da Justiça, com o apoio de entidades da sociedade civil, reelaborou a classificação indicativa dos programas veiculados nas emissoras da TV aberta. A classificação foi publicada em 12 de fevereiro de 2007, através da Portaria nº 264, que determinou os horários para programas inadequados a crianças e adolescentes, conforme a seguinte classificação: após as 20h para maiores de 12 anos, 21h para 14 anos, 22h para 16 anos e 23h para 18 anos de idade.
As novas regras para a classificação têm o objetivo de preservar crianças e jovens de conteúdos inadequados à sua faixa etária. Porém, o artigo 5 determina que certas obras audiovisuais estão isentas de uma análise prévia, mas alerta; qualquer abuso cometido, a emissora poderá ser responsabilizada. É importante ressaltar que a proposta inicial da classificação indicativa de programas de televisão não agradou às emissoras, que recorreram. Porém, o governo não abriu mão totalmente das reivindicações, embora tenha deixado a critério delas o processo de classificação.
No momento, gradativamente, está se substituindo o sistema analógico, pelo sistema digital de televisão, que traz melhoria não só na qualidade do som e da imagem, mas sinaliza possibilidades como a interatividade, a conectividade à Internet, a mobilidade, a portabilidade, a multiprogramação entre outras, devido à sua plasticidade, que permite uma estrutura em rede horizontal e descentralizada.
Todo esse crescente desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação, possibilitados pela digitalização, tem gerado grandes expectativas, especialmente, na criação de novos espaços de produção de cultura e conhecimento. Esse novo cenário vem chamando a atenção de profissionais de diversos campos que, na busca por uma comunicação mais democrática e responsável, realizaram, em dezembro de 2009, a Conferência Nacional da Comunicação (Confecom), um importante espaço de reflexão sobre as políticas de regulação da mídia. Ressalta-se que, dentre os vários temas abordados, a discussão trouxe à tona diferentes pontos de vista, revelando ser indispensável definir responsabilidades com a informação pública de qualidade, o caráter educativo de sua programação, que nela deve estar presente, assim como a função de cunho educativo dos meios de comunicação e outras diretrizes.
Diante dessa realidade, o governo, atualmente, está discutindo e encaminhando uma nova legislação que busca analisar o fenômeno da convergência entre os diferentes meios de comunicação para que contemple os princípios citados pelo artigo 221 da Constituição Federal. Estes são: finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; promoção da cultura nacional e regional; produção independente; regionalização da produção cultural, artística e jornalística; respeito aos valores éticos e sociais.
Assim, quanto aos programas educativos televisivos, é importante pensá-los nas dimensões do imaginário, do cultural, do afetivo, e entender ensino-aprendizagem como diálogo. Ressalta-se que o caráter educativo de um programa de televisão pode ser determinado a partir das aprendizagens que ele instiga na recepção, contribuindo para a formação pessoal. Portanto, produzir audiovisuais educativos exige um trabalho mais criativo, que envolve conhecimentos específicos da área pedagógica, além dos conhecimentos técnicos da área da comunicação, bem como profissionais comprometidos com a responsabilidade social.
Espera-se que as reflexões e sugestões da Confecom, em especial as voltadas à educação, sejam contempladas, reacendendo as esperanças na democratização das comunicações no Brasil.
* Professora na rede municipal de Dois Irmãos (RS), membro do Grupo de Pesquisa CEPOS (apoiado pela Ford Foundation) e doutora em Ciências da Comunicação da Unisinos.
Fonte: Revista IHU Online