terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Alternativas para o audiovisual na convergência digital

Por Valério Cruz Brittos e Ana Maria Rosa*

A proliferação de espaços alternativos para o audiovisual é cada vez mais evidente em função tanto dos resultados da digitalização e da convergência dos meios, como também por expressão da própria dinâmica cultural, tornando possíveis relações midiáticas antes impensáveis. As aberturas ocorrem a partir de brechas emersas do entroncamento entre os diversos meios, como decorrência da ação social sobre a política, a economia e a tecnologia.

A migração das diversas mídias para o digital reforça a convergência, não somente inter-relacionando-as, mas também provocando um encontro nos formatos: há uma crescente dificuldade de diferenciar cada meio – rádio, televisão, jornal impresso, internet –, em uma realidade de constante encontro de todos eles em um mesmo ambiente.

Embora a convergência não seja inclusiva por si, nem constitua um processo novo, a etapa atual permite que outros atores se apropriem de lugares de fala abertos recentemente. Portanto, o que se percebe agora como uma abertura para outras apropriações, mais contundentes, dos espaços midiáticos e, especialmente, do audiovisual, é um conjunto de forças relacionadas: é a convergência dos meios e a digitalização, num quadro de demanda ampliada de uso da tecnologia para midiatização de conteúdos próprios, deixando de depositar exclusivamente em mãos alheias o anseio comunicativo.

Mensagem instantânea ou língua própria

Nesse sentido, cabe pensar que a apropriação em transcurso nesses espaços alternativos para o audiovisual não está enquadrada em modelos, nem somente reproduz algo já conhecido. Embora cada sujeito esteja aculturado de acordo com experiências de audiovisual que vivenciou, em seu próprio processo de produção há rupturas e inovações particulares. No entanto, é nítido que, mais do que a procura por quebrar a forma de fazer audiovisual hegemônica, prevalece o propósito de ocupar o espaço hoje disponível. É essa intenção que pode ser observada nas diversas vozes que querem interagir entre si e também participar da arena audiovisual.

Se neste início o padrão tecno-estético das propostas ainda é similar ao convencional, tomado como natural, projeta-se que com algum tempo de experimentação haverá rupturas significativas, permitindo até mesmo a criação de nichos de linguagem, independentemente dos resultados culturais de médio e longo prazo, conforme atestam exemplos de vivências de internet que já se conhece: adolescentes escrevem pelos programas de mensagem instantânea on-line em uma língua própria, adaptada às necessidades que encontraram aí.

Circunstâncias político-econômicas

Paralelamente, não cessa o movimento de apropriação e reapropriação, na relação dialética entre mídia hegemônica e não-hegemônica. Desta forma, também os novos nichos tendem a ser apropriados pelos capitais, conforme a lógica das indústrias culturais. De qualquer sorte, entende-se que, como em algum momento foi vivenciada a passagem da carta enviada pelo correio convencional para o e-mail, e posteriormente a chegada do chat on-line, está em curso hoje a mudança do audiovisual. Muito mais profundo do que da carta para o e-mail, pois ambos eram pessoais, a migração do audiovisual da TV ou cinema para o compartilhamento permitido pela tecnologia de hoje muda em si a lógica com que se convivia, na maioria das vezes, com esse espaço de comunicação. Não se podia criar um vídeo e compartilhá-lo com tamanha agilidade, facilidade e baixo custo. O passo importante da tecnologia atual é justamente aproximar o audiovisual das pessoas, permitindo que todas as etapas desse processo midiático possam ser controladas pelo cidadão comum.

Em resumo, a mudança tecnológica dá asas às necessidades comunicacionais latentes nos indivíduos ou grupos sociais. Percebe-se, contudo, que essa liberdade é também controlada pelas forças econômico-políticas de cada sociedade, tendo-se como exemplo claro disso toda a discussão sobre a necessidade de acesso a banda larga com baixo custo no Brasil. Embora se saiba da real necessidade de acesso à internet de forma eficaz para o pleno exercício da cidadania hoje, não é apenas isso que está em jogo quando a discussão é colocada em prática: o que está em debate são circunstâncias político-econômicas, em que prevalecem tendencialmente interesses do empresariado e dos governos, com a sociedade em meio a isso.

*Respectivamente: Professor titular do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos, pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e membro do Grupo CEPOS; e Mestranda em Ciências da Comunicação pela Unisinos e também membro do grupo CEPOS.

Fonte: Observatório da Imprensa