Ainda que esteja entre os países mais pobres do mundo, Moçambique já ostenta uma presença marcante nos seus centros urbanos e em zonas mais afastadas de "telemóveis", como os portugueses e moçambicanos falam do telefone celular.
A Mcel ocupa os espaços nos outdoors e seus pontos de venda e assistência reforçam essa presença de uma nova tecnologia onde aparentemente tudo seria atraso e desconexão.
Além da Mcel, estão em Moçambique a Globo e a Record, a primeira recentemente renovou a parceria com a retransmissora local. Da Record, comenta-se que boa parte dos brasileiros trabalhando com a rede no país estão em atividades missionárias - dada a importância do dízimo no modelo de negócios da "tv do bispo".
O país africano de língua portuguesa é bem posicionado com relação à África do Sul e o que à primeira vista é um país pobre e atrasado mostra-se como fronteira de alto crescimento em setores globalizados e competitivos como telefonia celular e televisão.
O telefone celular é objeto de reflexões de amplo alcance formuladas pelo sociólogo moçambicano Elisio Macamo: "Tenho em mim que o celular se tornou num artefacto essencial à compreensão de alguns aspectos do nosso mundo da vida e isto, tal e qual o dinheiro visto por Simmel, como causa e efeito da transformação das condições de sociabilidade num contexto de cristalização da tensão entre o indivíduo e o colectivo".
Simmel analisou o dinheiro como uma realidade tão decisivamente imaterial quanto aparentemente a mais material, fez uma análise não-materialista do símbolo da riqueza material.
Hoje os cadernos especializados em mercados de luxo como relógios tratam do celular como novo símbolo não apenas de uma função, mas de uma importância social e econômica. A edição do último domingo do Financial Times tem esse tema na capa do caderno "Relógios e Joalheria". Trata dos "mobile phones with a Swiss twist", um jeito próprio de explicitar status por meio do uso de "luxury communication devices".
Macamo e o Financial Times atentam para o mesmo processo revolucionário nas cadeias produtivas de riqueza, identidade e conhecimento contemporâneas - a mídia digital tornou-se ubíqua e locativa, global e local, instrumental e prática porém igualmente simbólica e intangível.
Numa reunião entre altos executivos em Londres ou nas ruas de Maputo, o celular está transformando a linguagem líquida da cultura digital em temporalidades móveis com fronteiras plásticas entre o indivíduo e a sociedade, a auto-defesa e o agrupamento, o trabalho e o lazer.
(*) Foto de Eduardo Vizer, loja da Mcel em Maputo.
(**) Link para as reflexões de Elisio Macamo sobre o telefone celular a partir da obra de Simmel:
http://ideiascriticas.blogspot.com/2008/04/o-celular-1.html